terça-feira, 4 de novembro de 2014

Música - Berlin (1973), Lou Reed

Berlin seguia-se a Transformer, aposta glam-rock de Lou Reed em 1972 que o catapultou para a fama. Contava a história de Jim e Caroline, viciados em anfetaminas, e a forma como os dois se conheceram e criaram família na cidade alemã. Mas contava-a como só Lou era capaz: de forma assustadoramente negra, repleta de nihilismo e de referências perturbadoras a drogas e a violência doméstica. Acompanhado pela grandiosa produção irrepreensível de Bob Ezrin, Lou criava, assim, o seu melhor e mais coeso álbum a solo.

Este trabalho prima pela forma como mostra a evolução e o amadurecimento das suas personagens. Na primeira sequência ouvimos como se conheceram (“In Berlin, by the Wall”, na faixa que abre o álbum) e é-nos contada a frustrante vida da dependência (“How do you think it feels/ when you’ve been up for five days (…) because you’re afraid of sleeping”, num dos temas mais electrizantes do disco, How Do You Think It Feels). Na segunda parte, contudo, quando o amor do casal se vê sobreposto pela violência (“Caroline says/ as she gets up from the floor/ you can hit me all you want to/ but I don't love you anymore”, em Caroline Says II), Reed leva-nos ao lado mais negro da vivência deste "amor", nas últimas três faixas, verdadeiramente devastadoras. A assustadora The Kids narra o dia em que os filhos lhes são tirados, antes de Caroline se suicidar (This the place where she cut her wrists/ that odd and fateful night”, na arrepiante The Bed) e de ouvirmos Jim, impávido, a contar-nos o que aprendeu com tal tragédia: acaba em grande com Sad Song, onde um duo de guitarras nos leva ao climax maravilhosamente orquestrado em que ouvimos a personagem masculina, incapaz de se exprimir, desabafar friamente as palavras do título sobre um coro imponente. 

Naquele que poderá ser o disco mais deprimente de sempre, culpado de deitar por terra a oportunidade que Lou tinha de se sagrar uma estrela mundial, o próprio investia a sua alma como não voltaria a fazer em mais nenhum registo da sua longa carreira. Questionado mais tarde, diria que editá-lo era a pior ideia que já tinha tido. Mas Lou estava errado.

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